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SEGMENTAÇÃO E PLURALIZAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLIC

SEGMENTAÇÃO E PLURALIZAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLIC

 

§10.A SEGMENTAÇÃO E PLURALIZAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

 

O estudo da Administração Pública, segundo uma abordagem própria das ciências sociais, analisa o poder administrativo e a sua presença na sociedade, as conexões entre o poder e a organizações que o veiculam, quer enquanto o poder público necessita de um conjunto de meios materiais, financeiros e humanos para actuar, quer enquanto a organização vertebra o conjunto de capacidades humanas que passam a ser usadas pelo poder, que tende a dominá-los, para exercer efectivamente um dado domínio social.

 

A Administração Pública é um elemento do Estado em sentido amplo, político, do Estado-Comunidade.

As Administração Pública, pois são plurais, são uma concretização deste, que de outro modo, sem organização, sem meios humanos, seria uma simples ideia abstracta.

O Estado é uma criação cultural, recente, e tal como o Estado, a Administração Pública é também um produto histórico, sendo certo que, segundo alguns autores, só há verdadeira Administração quando surge o Estado moderno. Isto não significa que noutras épocas não tenham existido sociedades politicamente organizadas, e desde logo impérios.

Noutras épocas, existiram organizações, por vezes até muito desenvolvidas, ao serviço do poder político, quer no império faraónico ou chinês, no Baixo-Império romano ou no império bizantino, mobilizando grande número de meios.

Mas não existiam senão realidades «estaduais» realizadoras de um conceito diferente de sociedade política, mais incipiente. Normalmente realizavam um poder político pessoal. Havia impérios, havia reinos, comunidades individualizadas, diferenciadas.

 

Portanto, nessas épocas existiam organizações ao serviço do poder político, máquinas administrativas, nomeadamente militares e até agentes diplomáticos, etc., mas não eram Administração Pública na acepção actual, porque estas só existem, como considera a ciência administrativa francesa, quando as organizações ao serviço do poder actuam como elemento do Estado, situadas fora de uma ligação estrita à pessoa do próprio soberano, quando ela é algo ínsito à própria sociedade, como elemento indispensável ao Estado, identificando-se formalmente com o próprio Estado moderno com o qual está em relação íntima.

 

O Estado moderno surge com o fim da Idade Média, surge com o Renascimento na Idade Moderna, quando desaparece o feudalismo político e começa o desenvolvimento da burguesia e do capitalismo comercial e financeiro, o que situaria o aparecimento da Administração Pública com o surgimento das monarquias absolutistas.

 

No entanto, a formação de Estado moderno e a configuração moderna das Administrações públicas é algo que só fica completo com a Revolução Francesa, ao despersonalizar-se o poder, que deixa de estar na pessoa do rei absoluto, soberano, porque a soberania passa para o povo, ficando o antigo soberano apenas rei no Estado, e então em Estado liberal pós-absolutista se juridifica e racionaliza a vida pública com o submetimento do Estado ao Direito.

 

Portanto, é depois da Revolução Francesa, com o aparecimento do Estado de Direito que efectivamente a configuração moderna das Administrações (e o próprio direito administrativo) ganham a sua natureza actual.

 

A Administração Pública é portanto um produto histórico e, por isso, podemos situar a moderna Administração Pública.

Mas não é (nem ela nem o direito administrativo que lhe anda associado) fruto de uma geração espontânea, na medida em que nem sequer há um corte abrupto entre o Antigo Regime e a nova organização administrativa saída da Revolução Francesa, como o demonstra TOCQUEVILLE.

 

A origem da Administração Pública está nos exércitos dos agentes dos reis a origem das nossas Administração Pública actuais, que depois seriam submetidas, no Estado Constitucional, não já a um rei soberano mas à lei, emanação da representação do povo (ideia de democracia parlamentar), passando elas mesmo a ser o elemento estável, dada a circulação do pessoal político em democracia.

 

Em certos momentos e Estados, como em Portugal ou França, em que as revoluções ou eleições permanentes traziam mudanças de governos e até de Constituições, a Administração essa permanece.

 

E esta Administração merece ser objecto de conhecimento científico, desde logo para analisar o poder extralegal dos administradores, o poder burocrático, porque apesar de ao serviço da sociedade, sendo organizações, ganham poder e passam a defender uma lógica de poder pessoal. Mesmo em democracia essa factualidade existe, logo deve ser estudada, porque esta Administração Pública, tal como ela, é pode ser objecto de conhecimento científico.

Mas a ciência da administração não é uma ciência no sentido convencional, porque objecto e método não se condicionam mutuamente.

A ciência da administração tem usado vários métodos e abordagens diferentes retirados das várias ciências sociais.

Há um predomínio do objecto sobre o método, sendo aquele que dá unidade científica à matéria.

O objecto da ciência da administração é a própria organização administração como organização, aparelho ao serviço do poder.

A ciência da administração tem como finalidade o conhecimento das Administração Pública sob qualquer perspectiva tendo em conta a sua situação real e as suas relações com o poder e a sociedade.

 

Em termos de características das Administração Pública reveladas pela ciência da administração, podemos sintetizá-las dizendo que elas são a especificidade, a extensão e fragmentação, a contingência (intimamente ligada à sua historicidade) e a interdependência entre a Política e a Administração.

 

No que se refere à especificidade, a respeito das organizações privadas, analisável desde lgo em termos diacrónicos, pela comparação da actual Administração Pública com as organizações públicas de outras épocas, junta-se a análise sincrónica, de comparação com todas as organizações existentes na sociedade actual.

Ela tem carácter específico, quando comparada com organizações privadas, empresas privadas ou outras existentes, mesmo no seio do Estado, como partidos políticos, sindicatos, igrejas e associações patronais, etc.

A Administração Pública aparece como uma organização qualificada pela titularidade formal do poder e dotada de um sistema de dominação, embora não se possa negar-lhe aplicação de conhecimentos e princípios válidos para todas as organizações.

 

Quanto à extensão, a Administração Pública hoje tem uma extensão extraordinária quanto à estrutura e quanto aos fins desenvolvidos por exigências do Estado social. Mas a amplitude dos fins não é um fenómeno unitário porque engloba uma multiplicidade característica de formas de intervenção. Há vários tipos de intervenção administrativa. A Administração Pública abarca as estruturas indispensáveis para o exercício do poder por meio da coacção e repressão, ou visando a efectivação de prestações de serviços aos cidadãos ou o controlo de entidades particulares que os prestam, assim como a obtenção de bens em condições análogas à da produção em empresas privadas comerciais ou industriais, e a planificação ou direcção económica distinta da intervenção em sectores económicos concretos, etc.

 

E a extensão deu origem à sua fragmentação.

As Administração Pública não podem considerar-se de modo unitário, pois que não podem ser organizações do mesmo tipo uma organização que enquadra o poder ligado às funções de soberania. às organizações prestadoras de serviços ou produtoras dde bens. Não há uma só organização pública, mas uma pluralidade de organizações e administrações públicas, o que afasta as concepções  weberiana e marxista assentes na existência de uma só organização burocrática.

Hoje, põem-se mesmo problemas de relacionamento entre diferentes organizações administrativas e o seu prolongamento funcional, numa cadeia de entidades dotadas de autonomia, desconcentradas ou mesmo descentralizadas.

 

Quanto à contingência das Administração Pública, importa referir que a característica da contingência e da historicidade vão juntas. A seguir à Igreja Católica, as Administração Pública têm primazia histórica. E elas são função do território, povoação, nível de desenvolvimento do estado e dos valores culturais.

 

Embora o modelo básico seja importado quer da administração napoleónica quer das instituições inglesas que funcionam como esquemas gerais que são enformados por conteúdos específicos bebidos nas sociedades locais.

 

Quanto à interdependência entre Política e Administração, há que referir que esta se separa daquela em termos conceptuais.

A doutrina sempre tem procurado traduzir essa diferença difícil de estabelecer em termos concretos.

Desde logo dificuldades quanto às noções gerais, quanto à distinção material das actividades e mesmo quanto às diferenças formais entre actos políticos e administrativos.

Tudo, desde logo, até porque qualquer organização pública participa do poder político.

Há mesmo quem considere que se deve prescindir da distinção material entre Politica e Administração.

 

A ciência da administração surge na Europa em reacção contra o estudo da ciência da administração americana, baseado na eficácia, embora integre elementos deste estudo, ressuscitando a velha tradição científica europeia do século XVIII, antes do aparecimento do Direito Administrativo.

 

Numa primeira etapa, procurou seguir-se na escolha de um objecto de análise, isto é, os fins da Administração Pública.

 

A doutrina francesa, com TIMSIT, veio centrar a ciência da administração no estudo dos modelos administrativos, o liberal, o marxista e o weberiano.

O primeiro, partindo de uma consideração política da Administração Pública e portanto aceitando a distinção entre elas, dada a subordinação da Administração Pública à lei como princípio básico do Estado de Direito.

 

Em relação ao Antigo Regime, a distinção faz-se com base em dois factores: o poder dos funcionários que são dominadores da estrutura do Estado e a abstenção do Estado como protagonista da vida económica.

Portanto, parte-se de uma rigorosa distinção entre os âmbitos público e privado, ou seja, entre o Estado e a sociedade.

 

No segundo modelo, o marxista, a Administração Pública está intimamente ligada ao estado, elemento inseparável, embora os novos teóricos, como GRAMSCI, POULANTZAS, etc., afirmem a diferenciação entre Estado e Administração Pública, com a autonomia da Administração Pública.

 

O terceiro modelo, o de MAX WEBER, parte da diferença entre poder e sistema de dominação, afirmando que numa sociedade evoluída, o sistema de dominação típico é o de organização burocrática.

Os funcionários públicos não obedecem a um chefe tradicional ou carismático, mas à lei, manifestação da racionalidade.

O weberianismo teve influência nos estudos americanos sobre organização.