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CONSTITUIÇÃO E CONTROLO DAS FUNÇÕES DO ESTADO

CONSTITUIÇÃO E CONTROLO DAS FUNÇÕES DO ESTADO

 

 

§7. CONSTITUIÇÃO E CONTROLO DAS FUNÇÕES POLÍTICA, EXECUTIVA, LEGISLATIVA E JURISDICIONAL

 

O Estado contemporâneo é um Estado executor da Constituição, que vincula todo o poder estadual que ele funda, porque Estado teleocrático-programador.

 

A função política, assentando sempre na Constituição, já não pode ser aceite como juridicamente livre, porque qualquer acto do Estado necessita de habilitação constitucional, pois é a Constituição que limita e dirige toda a actividade estadual, o que só admite uma relativa heterodeterminação, quer no plano internacional (basta ver os princípios a aplicar nas relações internacionais expressos no artigo 7º, etc.), quer no plano nacional, com orientações de actuação.

E, no plano interno de execução da Constituição, a lei já não tem de assumir carácter geral, abstracto, como regra de direito de conduta.

 

No Estado Social de Direito, ao serviço de objectivos sociais, dentre os meios de prossecução da função política avulta a legislação, que segundo GEORGE BURDEAU seria uma espécie daquela, perdendo a sua autonomia como função do Estado, a favor da função política que, em sua substituição, aparece precisamente como a função central do Estado.

Isto corresponde à superação do enquadramento do pós-Estado de Legislação Parlamentar, em que a lei não teria significado político, pois seria um conceito essencialmente jurídico.

 

A tentativa de construção de um modelo normativo do Estado de Direito Liberal, reduzindo o político ao jurídico, levou a uma instrumentalização política da lei, erigida em acto típico da função política.

 

Ora, a lei já não é só a norma geral e abstracta, criando direitos e deveres, mas também um instrumento de reforma do Estado.

Daí, a distinção entre lei clássica, em sentido estrito, e lei-medida, aquela orientada por critérios duráveis de justiça, esta por critérios fugazes de conveniência, dando aos órgãos legislativos meios de exercício da função administrativa.

 

No Estado Social de Direito, a noção de lei depende do processo criativo e da força jurídica, sem condicionantes materiais que não sejam as da constitucionalidade.

É um acto do Estado, livre, dos poderes constituídos, só definível por critérios formais.

E se a noção de lei é sempre um conceito formal, deixa de ter sentido o recurso a critérios de substancialidade para construir a distinção entre lei em sentido material e lei em sentido formal.

De qualquer modo, apesar de o Estado Social ser um Estado teleocrático, com normas constitucionais e legais, dando ordens à Administração, ao serviço da mudança política, o Estado não pode deixar de continuar a ser também Estado nomocrático, governado por leis com carácter geral e abstracto, defensoras dos direitos, liberdades e garantias, únicas que podem viabilizar a sua actuação.

 

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No que concerne às relações entre a Função Legislativa e a Função Jurisdicional, tal como se referiu no início, no século XX, o princípio da separação de poderes assenta na ideia de fiscalização e coordenação, de tal modo que LOEWENSTEIN fala numa função de controlo como função autónoma do Estado, com os seus controlos políticos e jurisdicionais, quer da legalidade da Administração Pública, quer da constitucionalidade da legislação, explicando o papel crescente do poder judicial, verdadeiro contra-poder e assim instrumento da função política, porque fiscalizador de todos os poderes e portanto também já do próprio poder legislativo cujos actos «anula», qual «legislador negativo».

 

Isto leva-nos a concluir que a peça central da ideia que subjaz á razão de ser da separação de poderes passa, hoje, pelo sistema de controlos jurídicos e jurisdicionais.

A ideia de uma função jurisdicional vem das origens da monarquia inglesa, aparecendo de novo, hoje, no Estado de Direito contemporâneo, a velha contraposição Gubernaculum - Jurisdictio.

 

O controlo da constitucionalidade das leis levanta problemas de delimitação entre o legislador positivo e o, por KELSEN considerado, «legislador negativo», sendo certo que este tem naturalmente um limite que, anulando o produto daquele, não anula aquele, o que impede que apareça como seu substituto, como contralegislador, usurpando o núcleo essencial da função legislativa, sendo certo que, contrariamente à Jurisdictio, a legitimação democrática do Parlamento impõe um primado político deste e, portanto, uma presunção de constitucionalidade das suas leis, implicando uma judicial self-restraint, viabilizadora do princípio da separação de poderes.

 

O Estado de Direito passou de Estado de legislação parlamentar a Estado de Jurisdição, executor da Constituição, em que o primado do legislativo não obsta à sua limitação pelo poder judicial.

A tripartição clássica das funções do Estado, esbatidas as suas fronteiras e relativizados os critérios de caracterização material e de distinção, fez acabar com a pretensão de uma teoria geral, de valor universal e intemporal, das funções estaduais.

Hoje, o princípio da separação, mesmo numa perspectiva institucional de âmbito horizontal, só pode enquadrar-se em termos constitucionalmente situados, enquanto ganhe importância constitucional a concretização de divisões institucionais, características da Administração Indirecta (e divisão institucional-vertical de poderes), divisões territoriais de poderes em construções muito variáveis de separação institucional de nível vertical, com um aprofundar do princípio organizacional do Estado que é o princípio da descentralização político-administrativa (Regiões Autónomas, Estados federados, Länder) ou descentralização meramente administrativa, autárquica, característica da existência de autarquias locais ou regionais, autónomas do Poder Executivo Central, ambas integrando a Administração Pública e partilhando a função administrativa.

 

Tudo visto, o Poder Executivo desenvolve não só actividade administrativa, mas também normativa e jurisdicional. E, por outro lado, desenvolve igualmente actividade política e governativa.

 

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